Quando entrei pela primeira vez no carro de minha instrutora de reciclagem, eu estava tão, mas tão nervosa que nem li se na faixa amarela que envolvia seu corsinha de cabo a rabo vinha escrito autoescola ou não. Vi apenas que a cor era amarela e pra mim ficou de bom tamanho: só queria que as pessoas identificassem que eu não sabia dirigir e assim fossem mais pacientes com qualquer barbeiragem ou com os meus 30 quilômetros por hora.
Um carro destinado à reciclagem de motoristas habilitados é praticamente igual ao carro de autoescolas: duplo comando de freio e acelerador, um espelho retrovisor no parabrisa do passageiro, a tradicional faixa amarela na lataria.
Se bem que esta faixa pode ser uma faca de dois gumes. A maior parte das pessoas respeita, entende que você está aprendendo, não buzina, não cola na traseira, dá a preferência. Mas sempre tem aquele ser estúpido, que atende pelo nome de mal-educado, achando que o aluno de autoescola é a vítima perfeita para sustos. No geral, entretanto, a faixa mais ajuda que atrapalha.
Motoristas de reciclagem desfrutam das benesses desta faixa. Eu desfrutava, só que com requintes. Percebi que, no sinaleiro, as pessoas viravam o rosto para me olhar, e sorriam de forma complacente. Saindo de casa, um conhecido me viu dirigindo e me deu os parabéns. Além destas cortesias, era maravilhosamente fácil dirigir com um ônibus atrás, com um caminhão na frente – o corsinha parecia mágico.
Foi só lá pela minha décima ou décima-primeira aula que, mais tranquila, pude prestar atenção na faixa amarela na lateral do carro de minha instrutora: não estava escrito autoescola, mas reciclagem. Puxa, pensei, então estou dirigindo bem; ninguém teria benevolência com alguém que já sabe dirigir!
Meu orgulho durou pouco. Quando minha instrutora se foi, olhei a traseira do carro e lá estava escrito: direção defensiva. Quando ela subiu numa rampa para voltar, li o adesivo da frente: medo de dirigir.
Suspirei. Afinal as pessoas não eram boas comigo, elas apenas se afastavam do meu carro de medo que eu lhes batesse ou tivesse um surto psicótico no volante. Na época parecia constrangedor. Hoje, alguns milhares de quilômetros de mãetorista depois, acho que foi libertador: quantas vezes você tem chance de pegar o carro e dirigir como se tivesse uma sirene em cima, todos lhe dando passagem, hein?! Eu tive! E ainda posso contar a piada!